O Trabalho na Berlinda



Se não precisássemos de dinheiro teríamos muito mais vagas do que desempregados.

Certas palavrinhas mágicas deveriam ser banidas do vocabulário das empresas. Motivação, comprometimento e produtividade, de tão batidas, chegam a provocar uma atitude contrária ao que de fato significam. Um funcionário para ser motivado ou comprometido decididamente não precisa ficar ouvindo isso o tempo todo quase que como uma “chinese chicking torture”. É certo que a motivação e o comprometimento devem figurar como o caminho para se abraçar um objetivo. E é o intuito de se alcançar uma meta traçada que culminará na produtividade. Mas esta meta tem de adentrar um espaço que ultrapassa os limites da empresa. A meta precisa também ser pessoal. E qualquer meta pressupõe retorno, pois estamos falando de seres humanos, e não de máquinas.
O peso destes três conceitos (motivação, comprometimento e produtividade) nos bastidores de RH e gerências das mais variadas, parecem significar a única saída em prol da mobilização de funcionários. Como se incutir uma ideia fixa significasse a salvação da lavoura e não, na verdade, o movimento oposto que é a promoção do ambiente propício para as pragas que atingem qualquer cultura.
A ideia corrente que promove um significado de motivação como uma atitude de dentro para fora está absolutamente equivocada. Digo isso por que, motivação e comprometimento são atitudes geradas por um compromisso mútuo de qualidade. Estar motivado a algo implica pensar a situação de nossa relação com este algo. Buscamos a satisfação que é resultado da qualidade daquilo que recebemos. E na busca pela satisfação, tanto patrões quanto empregados devem ter “em mãos” um ambiente favorável para exercer uma atividade com qualidade. É uma via de mão dupla. Só se está motivado e comprometido com um objetivo que indique retorno. Regra básica do capitalismo, mas também das relações de forma geral. No caso das empresas, a motivação é fazer dinheiro, auferir lucro a donos e acionistas. No caso do funcionário, obter o pagamento pela sua mão de obra produtiva. Ademais, não só em dinheiro pensa o homem, mas também em reconhecimento. Falemos dele então.
Uma empresa, antes de qualquer coisa, precisa de talentos e ideias, ou seja, precisa de gente. De pessoas capazes de modificar um ambiente sem mobilidade de inovação. Seguramente que não precisa de robôs programados. O mais difícil não é encontrar talentos, o entrave está no olhar de quem deve buscar estes talentos. Estamos habituados a enxergar as coisas da maneira que queremos. Infelizmente, o olhar do costume que imobiliza dá menos trabalho. A força do hábito deste olhar, vai nos levar a buscar aquele perfil que vem acompanhando um sistema já instaurado no mercado de trabalho e pobremente modificado. Me fazendo entender: como gerente vou observar e buscar nos meus subordinados as noções que me foram passadas no decorrer de minha trajetória profissional. Mesmo que estas noções sejam um completo engano.
O maior erro nas recentes estratégias de “motivação”de RH está na ideia de que empresa deve ser “a extensão da casa”, de que “somos uma família”. Já que uma pessoa passa a maior parte do tempo de sua vida no trabalho, a empresa DEVE significar quase que a própria razão de vida do empregado. Incutir essa ideia na cabeça do funcionário é estratégia para mantê-lo com o pensamento, e também fisicamente na empresa, quando na verdade, em determinados momentos, ele tem de estar fora do ambiente de trabalho para viver e participar de outras relações que não aquelas de hierarquia e dos processos de produção. O que a maior parte dos “colaboradores”gestores não realiza (gosto de pensar que simplesmente não compreendem isso, a pensar que fingem não saber) é que o talento e a criatividade estão atrelados à uma percepção de mundo abrangente que envolve a participação em outros setores da vida social. Apreensão de mundo abrangente é certamente inviável na limitação de um único ambiente. Quando se vive a vida da empresa, ou somente nela, limita-se a capacidade de percepção da realidade global que somente as variadas experiencias sociais podem promover. Como resultado, restringe-se uma maior capacitação intelectual e criativa naturais do ser humano, produzindo funcionários que trabalharão de forma robótica, sem competência crítica e situacional e logo, limitada capacidade de decisão e criação. A qualidade do trabalho fica prejudicada e a motivação para a atividade quase inexistente.


Como modificar esta realidade? O primeiro passo é acabar com a fantasia de empresa como extensão de nossas casas. Empresa não é família, não misturemos os conceitos. Com família temos um vínculo sanguínio, de cooperação mútua e convivência baseado em valores e finalidade que perpassam os propósitos de uma empresa. O vínculo que temos com qualquer empresa é EMPREGATÍCIO. A finalidade da empresa é o lucro, portanto, nosso propósito na empresa deve ser o reconhecimento financeiro e intelectual de nosso trabalho. As relações pessoais, privadas, que podem eventualmente surgir no ambiente de trabalho, são coisas separadas de nosso objetivo dentro da empresa. Portanto, dizer que a empresa é família é forçar uma barra para se inventar vínculos que na verdade não existem. O ambiente de trabalho tem de ser agradável, respeitável e promover satisfação, mas isso não se consegue incutindo fantasias construídas com o intuito de sugar ao máximo a força laboral com o mínimo de custo. A política deve ser oposta: se preciso de seu talento para que meu negócio dê certo, pagarei por ele. 
Se olhamos por este lado, é um erro alegar que motivados são aqueles que deixam suas atuações em outros setores sociais, para se fazerem presentes em reuniões de empresa ou qualquer outra atividade vinculada a ela na folga ou em horário de descanso, sem receber nada por isso. A mesma regra que se aplica às empresas quando se fala em lucro, deve ser respeitada quando o assunto é o pagamento ao funcionário por seu tempo destinado à atividade produtiva ou qualquer compromisso resultante dela.
O segundo passo. Gestores devem aceitar e valorizar funcionários que prezam sua vida fora da empresa. É um erro acreditar que a motivação se mostra a partir da quase total desistência de vida pessoal e social, fora da empresa. Tempo para se ter uma participação ativa na sociedade, seja em outra atividade laboral paralela ou na canalização de energia em prol de educação e cultura, deveria ser política primordial para qualquer empresa já que, são estas atividades, que irão desenvolver novas habilidades que serão identificadas pelo bom gerente no decorrer do percurso profissional de seus subordinados.
Concluindo. Ser produtivo, motivado, comprometido e etc, somente é possível quando se tem qualidade de vida. Fingir que não adoece, que gosta de reuniões em dias de folga, que é feliz com o acúmulo de funções que inflam o ego mas não o bolso, não faz de ninguém os reais motivados. Motivados são aqueles que gostam do trabalho que fazem, que se sentem satisfeitos pela recompensa financeira e intelectual do trabalho prestado. Motivados negam veementemente a presença física robótica em situações que não trarão nenhum benefício à sua vida profissional, financeira e intelectual. Motivados têm sua privacidade respeitada, seu momento de lazer garantido e seu direito de descanso consumado. Motivados não precisam de cargos de confiança “cala a boca”. Motivados se valorizam como pessoa essencial no sucesso de qualquer empresa, mas não só nela. Eles entendem que a empresa pode até ficar, mas que sua vida uma hora acaba. Entendem que seu tempo deve ser pago porque, caridade não se faz para capitalista que visa lucro. Filantropia destina-se aos necessitados que precisam de ajuda para sobreviver.

Texto: Luciane Trevisan Leal

Um comentário:

Unknown disse...

Amiga. O que aconteceu? rsrsr
As pessoas nao querem ouvir a verdade. Precisamos de um encontro. To indo na Ucam amanha, adoraria te encontrar.
Saudades
Aline

 

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